segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Jornalismo econômico-literário

Jornalismo econômico-literário? Isso existe? Se não, vai aí uma tentativa de criá-lo...

(Se a janela estiver muito pequena para ler, clique no link do título "Parábola Friedmaniana" abaixo e leia direto no site do Scribd).

Parábola Friedmaniana

sábado, 18 de outubro de 2008

Oi e tchau!


Fila em Bauru para desbloqueio de celular: devagar


Sábado de uma tarde de outubro com muito sol em Bauru. No centro da cidade, no chamado calçadão da (rua) Batista de Carvalho, muitas pessoas aguardavam numa fila enorme. Havia gente de todas as idades, desde grupos de garotas adolescentes que falavam o tempo todo até senhoras com sorrisos de avós, além de pais com ar sério carregando filhos pequenos inquietos com o calor.

Animados pela publicidade veiculada por uma operadora na televisão, vieram desbloquear seus telefones celulares, ou seja, fazer com que funcionassem com qualquer operadora, não apenas aquela da qual o haviam comprado. O desbloqueio seria feito gratuitamente no posto montado para este fim em um veículo ao lado das Casas Pernambucanas. Algumas pessoas já aguardavam na fila por mais de três horas.

A organização para atender tanta gente era precária. A maioria aguardava diretamente sob o sol. Na hora do almoço, não houve revezamento de técnicos responsáveis pelo desbloqueio dos celulares no veículo da operadora. Os funcionários foram almoçar e o trabalho simplesmente parou por mais de meia hora. Algumas senhas foram distribuídas, mas não o suficiente para todos. Na verdade, não o suficiente para sequer metade dos que esperavam na fila. E, após as 15h, os formulários que os interessados deviam preencher também acabaram, complicando ainda mais o atendimento.

Para completar, promotoras passavam ao longo da fila de vez em quando para informar uma novidade que muitos dos candidatos ao desbloqueio dos celulares só ficavam sabendo depois de passar um bom tempo em pé no calor da tarde: nem todos os modelos de telefone podiam ser desbloqueados. Algumas pessoas trouxeram dois, três, até quatro celulares para desbloquear de uma vez. De uma jovam que levara três, só um seria desbloqueado.

Pergunto a uma das promotoras o motivo de haver somente um local para atendimento de tanta gente. Ela diz que os técnicos que fazem o desbloqueio têm de cobrir toda a região, ou seja, também as cidades próximas. Proponho uma entrevista, questiono se, dada a publicidade que foi feita e o interesse despertado nas pessoas, não seria o caso colocar mais postos de atendimento. Ela diz que nem ela nem os outros funcionários no local estavam autorizados a falar.

Mas com quem eu poderia falar então? Com algum diretor ou supervisor, diz ela. Mas onde eu poderia achá-los? Difícil encontrá-los, retruca a moça. Eles não ficam apenas em um lugar, ficam rodando pelos pontos de venda. Mas então com quem falar sobre a demora para o atendimento de desbloqueio? Argumenta ela que não há nem o que reclamar, afinal o desbloqueio não é uma obrigação da operadora, é feito apenas para ajudar o cliente. A obrigação seria da operadora onde o celular foi comprado.

Até aí tudo bem, a operadora em questão não tinha mesmo a obrigação de fazer o desbloqueio. Mas ela apresentou-se ao mercado paulista insistindo na idéia de que seria diferente das demais e que estaria preocupada em simplificar a vida do cliente, já cansado do atendimento das outras, muitas das quais oferecem um serviço ruim de pós-venda e um atendimento de péssima qualidade para as reclamações.

Mas as pessoas que passaram horas debaixo de sol porque suas operadoras de telefonia celular não faziam o desbloqueio ou porque cobrariam pelo serviço que ali era oferecido de graça não aparentavam achar que sua vida estava ficando mais simples. A forma de tratar os clientes que vi nesse sábado de sol e calor em Bauru pareceu a mais pura mesmice. Tentar fazer uma reclamação e não ter com quem falar? Já vi situação extamente igual em outras operadoras. Será que vai mudar?

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

O neoliberalismo morreu

Com a aprovação do pacotão de US$ 850 bi que supostamente salvará o mercado financeiro do apocalipse, o congresso norte-americano carimba o fim da política de opção pelo (e promoção mundo afora do) livre mercado iniciada no começo dos anos 80 pelo governo Reagan.

Desta vez, não há, ou pelo menos ainda não apareceram, figuras à altura de John Maynard Keynes e Frank Delano Roosevelt para dar respectivamente consistência intelectual e direcionamento político firme à empreitada da volta do estado como motor da economia. Tampouco há uma guerra moralmente aceitável ou sabidamente necessária como a II Guerra Mundial para garantir a demanda por produção que tire a economia da letargia.

Irã e Venezuela são, da perspectiva geopolítica norte-americana, ratos que rugem, para usar uma expressão hoje corrente. Não são inimigos à altura do Japão imperial ou da Alemanha nazista. E ao contrário do período entre-guerras da década de 30, o orçamento militar dos EUA já é alto e o arsenal disponível, grande. Isso sem falar que ele tem sido de pouca utilidade contra o inimigo difuso e superestimado do terrorismo internacional. Não há, resumindo, um cenário de canalização de esforços que facilite a saída da crise como houve no fim dos anos 30.

A era Bush começou com a queda do World Trade Center, para a qual ele não estava preparado, e termina com a queda de Wall Street, para a qual ele tampouco estava pronto. Ela deixa como herança certa omissão quanto à fiscalização e regulamentação das práticas de mercado e uma conta para o contribuinte pagar pela má gestão ou má fé de alguns atores do mercado financeiro. E fica a impressão de que eles podem continuar operando da mesma forma, pois não serão purgados pelo mercado já que o governo vai pagar a conta.

Bush sairá de cena ainda meio zonzo, sem saber direito o que aconteceu em setembro de 2008, mas tendo ajudado a pregar – com suas ridículas aparições na TV implorando a aprovação do pacote de ajuda aos bancos – o caixão do neoliberalismo que reinou na América por quase trinta anos. Um triste fim para um político republicano, mas bem merecido para ele.

Trinta anos foi também o tempo que o modelo econômico oposto, o do estado grande, reinou desde o fim da Segunda Guerra até a ascensão de Margaret Thatcher, quando a situação da Inglaterra havia decaído a ponto de o ex-império chegar à humilhação de sondar o FMI para pedir uns trocados. Depois foi a vez de Ronald Reagan, que chegou à Casa Branca nos anos 80 com o mesmo discurso da colega britânica sobre o enxugamento do estado. Como tudo hoje anda meio acelerado, pode ser que a nova moda de estadão pós-crack de 2008 nem dure tanto. Só o tempo dirá.

Mas enquanto nuvens negras ainda pairam no céu, as bolsas desabam e a economia de livre mercado sai pela porta dos fundos, surge uma janela de oportunidade para o terrorismo. Até agora menos capaz de derrotar Washington do que as carteiras de derivativos fajutos de Wall Street, ele pode aparecer de novo em cena, pois o ideal seria atacar justamente num momento de fraqueza dos EUA. Os alvos potenciais que se cuidem.

Buracos em Cabul e em Wall Street

A “forcinha” que o governo (leia-se contribuinte) norte-americano vai dar para tirar bancos e seguradoras do buraco pode chegar no fim das contas a duas vezes o PIB do Brasil. Isso mostra que nem lá o livre mercado será levado às últimas conseqüências. O resultado é que ficará a impressão de que a irresponsabilidade de certos grupos financeiros é, em última análise, paga pelo cidadão. A percepção desse fato impedirá que alguns operadores do mercado aprendam uma dura lição e os incentiva a ser irresponsáveis de novo no futuro, quando a poeira da atual crise baixar.

É óbvio que o governo está de olho nas próximas eleições e não quer ser visto como aquele que deixou o circo pegar fogo, mas as decisões de hoje do governo quanto à economia podem influenciar o comportamento econômico e financeiro da sociedade americana nas próximas décadas. E não deve ser para melhor. Um mercado tutelado não aprende a se regular por conta própria. Mas, lá como cá, visão de longo prazo nem sempre é o que conta.

Essa crise também deixa claro que o pior inimigo dos chamados falcões de Washington, que reinaram no governo Bush, com seu apelo à hegemonia pela intimidação do poderio bélico e uma inspiração um tanto messiânica para liderar o mundo pela fé e pela força, não é a Al Qaeda. O grande adversário é sua própria falta de tato para a condução de políticas econômicas. As barbeiragens nas finanças estão se mostrando mais danosas à hegemonia norte-americana do que supostos terroristas enfiados em cavernas no Afeganistão.

Adolf x Michael

A Inglaterra ainda travava uma renhida guerra quando o garoto Michael Philip nasceu em 1943. Seu poderoso inimigo estava logo ao lado, no continente, liderado por um certo Adolf, que a essa altura já via maus augúrios para sua campanha bélica, que de fato se encerraria com derrota uma derrota incondicional dois anos depois.

Dez anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, "Rock around the clock", por muitos considerado o primeiro o rock n'roll a ser registrado em uma gravação, já podia ser ouvido nos EUA. E vinte anos após o fim da quimera de dominação da Europa à base da força de Hitler, o riff de Satisfaction, dos Rolling Stones, já embalava festas. E a imagem do rebolativo vocalista da banda podia ser vista na televisão que se popularizava mundo afora.

Que século foi esse, o vigésimo da era cristã, que nos deu, em um intervalo de tempo tão curto entre uns e outros, os discursos raivosos de Adolf Hitler e os rebolados de Michael Philip (também chamado de Mick) Jagger? Como figuras tão díspares entre si conseguiam empolgar multidões na Europa ocidental e no exterior?

Poderíamos dizer que foi porque, no século XX, o mundo despertou para a comunicação de massas. Surgiram e se popularizaram o rádio, o cinema e a televisão. Hitler utilizou-se dos dois primeiros. Os Stones, dos três. Poderíamos dizer que os governos e os grandes grupos financeiros e industriais souberam tirar proveito desses novos veículos para cooptar as massas. Mas não seria suficiente.

O que viria a fazer diferença no século da ciência e da barbárie em escala industrial seria o que fez diferença em tempos anteriores. Mais do que o século da comunicação em massa, o século passado foi o século daqueles que souberam tirar proveito do momento que viviam. E era o momento de quem sabia se comunicar com as massas. Comunicar-se no sentido mais terrível da palavra. No século XX, como em todos os outros, fez a diferença quem pôde e soube tirar proveito do momento.

Alguns argumentarão que foi o tempo dos que sabiam manipular as massas. Mas manipular seria a palavra certa? Não. As massas não se manipulam cegamente. Elas concordam. Há uma cumplicidade tácita da massa com quem teoricamente as seduz e/ou "engana". Comunicação é interação. Você precisa processar o que ouve e vê, e você também tem preconceitos e, eventualmente, idéias não muito nobres até então quietas, à espreita, nas sombras do seu íntimo.

O que é conviniente paras as massas? Discursos em tom enfático que aglutinam em frases de efeito, impressões antes dispersas que despertam ódio, fúria ou esperança? Músicas debochadas que servem não apenas para a diversão mecânica dos sentidos, mas também convidam à cumplicidade da rebeldia contra a odem estabelecida?

Hitler e os Stones na verdade não propuseram nada de novo. Apenas apresentaram ao público algo que já estava subjacente, mas que até então ninguém assumira abertamente em sua plenitude, e pagaram para ver. Quando Hitler subiu ao poder, o fascismo não precisava ser inventado, ele já existia, bastou levá-lo a extremos. Quando os Stones começaram a compor, o rock n'roll já existia, bastou deixá-lo mais debochado.

O ânimo para a guerra e para a sublevação contra as convenções sociais já existia. Ainda existe. Quem serão os Adolfs e Michaels do século XXI? O que há de novo no íntimo de cada sombra na multidão que os ouvirá?

domingo, 14 de setembro de 2008

Minimalismo cromático: fotos


Exemplos de fotos que se enquadram no conceito que chamei de minimalismo cromático.

Madeira River


Green and blue

Flickr

This is a test post from flickr, a fancy photo sharing thing.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Manifesto pelo minimalismo cromático

Minimalismo cromático – ou colorido minimalista para quem preferir. Já vi o termo ser utilizado em alguns textos para se referir a fotos que apresentam poucas cores. Ou até mesmo para fotos em preto e branco. Também já o vi em textos que nada têm a ver com fotografia. Mas proponho-o aqui como algo diferente. Proponho que ele seja uma alternativa à estética do preto e branco na fotografia. Que se caracterize por fotos que, embora coloridas, evitem o excesso de informação cromática.

Mas o objetivo não é só poupar cores. É buscar um efeito estético pelo contraste entre duas ou três cores dominantes em cada fotografia. Assim, ao “preto x branco”, ao “claro x escuro”, apresento como opção o “azul x verde”, ou “marrom x lilás” e assim por diante. E a busca desta tensão entre cores tem sua razão de ser. Ela implicará na impossibilidade de a foto ter o mesmo impacto se vista em p&b.

Seria uma forma “anti-Sebastião Salgado” de fotografar? Acho que não. Eu não sou avesso ao P&B em contraluz que ele tanto preza em suas fotos. E ninguém pode negar a qualidade do seu trabalho e sua influência na moderna estética da fotografia. Eu mesmo já fiz experiências com contraluz. Todo fotógrafo gostaria de clicar como ele em P&B. Mas seja como for, o minimalismo cromático que vislumbro contrapõe-se ao P&B.

Apresento a seguir propostas para o minimalismo cromático da forma que concebo:

- P&B não é MC. P&B é P&B.

- Deve haver duas cores dominantes na foto. Três cores são aceitas, desde que uma delas seja o preto ou o branco.

- Branco e preto não devem ser as duas cores dominantes, senão seria melhor fotografar logo em P&B.

- Deve haver um contraste, uma tensão, entre as cores dominantes. É isso que as torna dominantes. Uma cor valoriza a outra.

- Destacar por computador informações cromáticas que já estão na foto não tem problema. Mas modificar características originais das fotos não é bem vindo, principalmente se implicar mudança das cores originais dos assuntos fotografados. Um pasto azul com uma vaca cor de rosa, além de ser de gosto duvidoso, não serve à proposta. (Nada contra o Photoshop ou similares, mas o MC deve ser buscado na hora da composição e do clique, não na edição).

- A relação de elementos em foco com outros fora de foco na foto é bem-vinda.

E só mais uma coisa. Fotografar ou não em P&B é uma questão de opção. Com o MC, não é bem assim. Às vezes eu não decido que vou fazer uma foto em MC. Eu simplesmente percebo que fiz depois que fiz. Outras vezes eu tento fazer a foto em MC, mas a opção de mostrar mais cores se impõe como mais adequada naquele momento.

Por isso, poucas das fotos que faço eu classificaria como MC. É porque não é uma questão de trocar o tipo de filme ou mudar modo de captura na câmera digital. É mais uma questão de ter a chance e tentar fazer. Ou fazer por instinto e só se dar conta depois. Enfim o MC não é só uma questão de opção, é também de oportunidade. E isso é o mais legal.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Enquanto a terra gira

Primeira experiência com star trails, muito a aprender


Star trails é um efeito em fotografia conseguido ao se apontar a câmera para as estrelas à noite, apertar o botão e deixar o obturador aberto por muito tempo, de meia hora a várias horas. Como nesse intervalo a terra continua girando, a câmera registra um rastro de estrelas no céu. Daí o nome em inglês. Parece efeito de Photoshop, mas é até melhor conseguido com câmera de filme, já que ela tem de ficar ligada muito tempo e as digitais consomem muito mais energia.

Quatro da manhã. O despertador do celular põe fim a quatro horas de sono. Banho rápido e troca de roupa para enfrentar uma das madrugadas mais frias do ano. Já na rodoviária de Bauru, o vento implacável não deu trégua até embarque e o refúgio no conforto da poltrona. Cinco horas, o ônibus parte para São Paulo. Na parada do café no Rodoserv, frio ainda mais intenso. Para combatê-lo e espantar o sono, um expresso bem forte.

No desembarque, já depois das dez horas, o frio estava passando e o sono deu lugar à pressa de pegar o metrô para o Anhangabaú. Algumas escadas depois do desembarque na estação, a Sete de Abril estava bem à frente, calma para um sábado de manhã.

E na primeira loja:
- Moça, vocês têm o controle remoto da D40X?
- Não, acho que você não vai encontrar nas lojas aqui da Sete de Abril.
- Não? E onde eu encontro então?
- É melhor você ir à T. Tanaka.
- E como que eu chego lá?
- Pergunta pro rapaz ali que ele sabe, - respondeu a moça, apontando para a loja em frente.

De pé, na tranqüilidade daquele sábado, o homem conversava com um amigo em frente à sua lojinha.
- Moço, como que eu faço para chegar à T. Tanaka?
- Ah, é fácil. É só pegar o metrô para a Santa Cecília. Fica na Martin Francisco - respondeu sorrindo.
- Obrigado, tenho que ir lá correndo.

Meia volta e três passos depois, ele chamou, calmo.
- Colega, só tem uma coisa. Você vai ter que ir lá na segunda-feira. O Tanaka não abre sábado.

Praticamente senti o chão se abrir sob meus pés.

- Como é que é?!
- O Tanaka está fechado hoje. Agora só na segunda.

O problema é que eu não podia esperar até segunda-feira. Já estava até com a passagem comprada para voltar a Bauru naquela mesma noite. E assim que voltasse teria pouco tempo para aprontar tudo e sair em uma longa viagem até Rondônia. E pelo jeito teria que fazer isso sem levar o que eu mais queria comprar em Sampa.

O controle remoto da câmera me permitiria tempos de exposição maiores, bem maiores, que os 30 segundos programáveis sem ele. Portanto ele me permitiria experimentar alguns star trails no meio da selva amazônica, ainda que com uma câmera digital.

Ainda meio atordoado, agradeci ao homem e decidi tentar a sorte em cada uma das lojinhas de produtos fotográficos restantes na Sete de Abril e na Conselheiro Crispiniano antes de desistir.

Na próxima loja, uma bela morena me atendeu. - Moça, vocês têm aqui o controle remoto da D40X?
- Nâo, infelizmente não temos.

Quando eu virei de costas, ela chamou. - Mas eu sei onde você pode encontrar.
- Onde?!
- Na T. Tanaka com certeza você encontra.
- Ah, sim. Claro. Obrigado...

A coisa estava mesmo difícil. Mas, finalmente, na quinta loja:
- Não, não temos. Só na T. Tanaka. Mas hoje não abre. Vá lá na segunda.
- Ok...
- Hum, espera – chamou o sorridente rapaz loiro da cara engraçada. - Deixa eu ver uma coisa. É da Nikon que você quer, né?
- Sim.

Depois de dois minutos revirando umas caixas no fundo da loja, ele voltou com algo nas mãos. - Acho que tem um aqui ainda, só não sei se está com bateria.

Diante dos meus olhos, estava finalmente o que eu esperara quase seis meses para comprar, resistindo à tentação de fazer uma dúbia compra pela internet ou pagar quase o dobro para fazer o pedido em Bauru mesmo.

Depois de o vendedor colocar a bateria, testei o brinquedinho, que apesar do elevado preço, nada tinha além de um botão a ser apontado para a câmera e pressionado. Mas ele permitiria disparar a SRL à distância e com a importante opção de tempos de exposição maiores. Minhas star trails estavam salvas.

Comprei também alguns cartões de memória e filtros para lente e fui passear no centro. Não resisti à tentação de testar o material, menos o controle remoto, que teria pouca utilidade para fotos com luz do sol. Em seguida almocei por lá mesmo e à tarde voltei ao terminal da Barra Funda para pegar o ônibus de volta.

Assim que coloquei os pés de novo em Bauru, percebi o estrago que o vento frio e o ar condicionado do ônibus haviam feito. Já desci gripado e febril. Mas com a promessa de star trails amazônicas quando fosse para Rondônia. Naquela noite, dormi com enxaqueca e sonhei com estrelas.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Estrada de ferro

Caminho com obstáculos




Foi legal fazer essa foto. Eu quis mostrar a formiguinha sobre uma velha cerca de ferro enferrujada de uma forma diferente. Procurei captar a perspectiva de mundo da própria formiga. Para ela, a cerca serve de estrada, e com direito a obstáculos, como o pequeno ramo seco caprichosamente enrolado no “caminho”.

A opção de não fotografar a cena de cima, como pareceria mais óbvio considerando o modo como vemos as formigas no dia-a-dia, ajudou a dar a essa impressão de visão de mundo da formiga.

O ângulo de incidência da luz é importante na fotografia, assim como os elementos de fundo. Neste caso, a luz do final da tarde, alaranjada, determinou as tonalidades predominantes. No fundo, céu e mata, desfocados pela opção de maior abertura do obturador, tornam cenário menos naturalista e mais peculiar.

Mas fotografar a cena com uma objetiva 18-55 mm, que não é a mais adequada para macrofotografia, não foi tão fácil. O foco automático não era o ideal devido à proximidade do sujeito da foto e ao fato de este mover-se. O foco escapava do tema, a poucos centímetros da lente, para as árvores, dezenas de metros atrás. O jeito foi mudar para manual.

Para “congelar” o movimento da formiga, o tempo de exposição foi pequeno (1/600 seg.). E para compensar o pouco tempo de luz que entrou para gravar a foto, o ISO (sensibilidade) do sensor, que na câmera usada vai de ISO a 100 a 1600, foi colocado no máximo.

Ultimamente, tenho produzido fotos caracterizadas pelo que chamo de “colorido minimalista”, ou seja, predomínio de duas tonalidades bem distintas. É o caso do vermelho-ferrugem e do azul celeste dessa foto.

Às vezes me pergunto se eu não estaria na verdade tentando fazer fotos em preto e branco sem me dar conta. Mas acho que não. Quando experimento tirar a cor dessas fotos no computador, elas não ficam como eu queria.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Che Guevara ainda é útil

Para salvar Ingrid Betancourt


Você já viu a foto. É uma das mais famosas do mundo. Mostra o guerrilheiro argentino Ernesto “Che” Guevara de boina, com olhar distante. Ficou conhecida como “Guerrillero Heroico”.

A imagem foi captada pelo fotógrafo cubano Alberto Díaz Gutiérrez, mais conhecido como Alberto Korda, em março de 1960 em Havana, durante evento em homenagem às vítimas de uma explosão. Mas só ficou conhecida anos depois. Virou ícone de jovens socialistas mundo afora depois que o Che foi capturado e morto na Bolívia.

2 de Julho de 2008. Após enganar os rebeldes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, conhecidas como FARC, infiltrando agentes na organização, o exército colombiano libertou a ex-candidata a presidente Ingrid Betancourt, três norte-americanos e 11 soldados colombianos, reféns que eram cativos dos guerrilheiros há anos na selva.

Um detalhe me chamou atenção quando relatos do resgate começaram a surgir. Foi o uso de camisetas estampadas com a foto de Guevara pelos agentes colombianos que se fizeram passar por membros de uma organização humanitária simpática aos guerrilheiros. A própria Ingrid Betancourt citou a indumentária dos agentes em entrevistas.

O fato de camisetas com a foto “Guerrillero Heroico” terem sido usadas para iludir as FARC é de uma ironia tão grande que causa espanto que isso tenha passado despercebido por jornalistas e intelectuais conhecedores dos movimentos de esquerda na América Latina.

O episódio mostra que a foto de Korda, mais do que peça ideológica -- ou até mitológica, como querem alguns -- é uma eficaz ferramenta de marketing. Funciona tão bem que pôde ser usada com astúcia para vender gato por lebre a rebeldes que vagem pela floresta há décadas combatendo o capitalismo.

Fadada a ser tema de livros, documentários e filmes pelo grau de inteligência e ousadia com que foi realizada, a operação bem sucedida do exército colombiano é o melhor uso já imaginado para a famosa foto de Che Guevara feita por Alberto Korda. E prova que, ao contrário do que muitos pensavam, o Che e a foto de Korda ainda podem ser úteis.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Do "tchá-tchá-tchá" ao rock de garagem

Por Angelo de Assis

“Lúei luái, ou nou, sê uí gara gou. Ie-ie-ie-ié”. Cantado assim, num inglês de bêbado que arremeda um improvável sotaque jamaicano, começa “Louie Louie”, hit gravado pelos Kingsmen que fala de um marinheiro que deseja voltar à terra natal para rever a amada.

Vários críticos consideram essa versão de 1963 a pioneira do que seria conhecido como rock de garagem: guitarras estridentes tocadas sem muita técnica; bateria sem sofisticação; baixo que se faz ouvir mais pelo volume do que pela destreza do instrumentista; vocais que não exigem de quem empunha o microfone mais do que o dom da fala, ou pelo menos do grito.

A versão dos Kingsmen tem ainda um teclado, tocado sem sutileza, marcando o riff que a tornou famosa, tão pegajoso que quem ouve uma vez não esquece mais. Se duvidar, experimente ver – ou melhor, ouvir – para crer.

Lançada quando os Beatles chegavam ao sucesso, “Louie Louie” chama a atenção por condensar a cartilha que muitas bandas seguiriam apenas tempos depois: arranjos rústicos em canções que não eram nenhuma maravilha em estúdio, mas serviam bem ao espírito anárquico dos shows de rock. E letras nada poéticas, mas entoadas pelo respeitável público depois de algumas cervejas.

Mas a história de “Louie Louie” começa bem antes dos Kingsmen. Composta em 1956 por Richard Berry, a canção estava mais para rythm & blues do que para rock, que dirá rock de garagem. E nem Berry foi original, pois a composição, digamos, “baseia-se” em outra mais antiga, a desconhecida “El Loca Cha Cha”, gravada por um certo Rene Touzet.

Só que mesmo a versão de Touzet é uma regravação de “Amarren Al Loco”, canção latina de Rosendo Ruiz Jr., músico cubano. Mas Touzet trouxe a inovação do famoso riff que seria copiado por Berry em “Louie Louie”. Depois disso, a música recebeu ainda uma versão já mais para rock dos Wailers – banda de Tacoma, Washington (estado do noroeste americano que tem o mesmo nome da capital), que nada tem a ver com o grupo de Bob Marley.

Foi a versão dos Wailers que os Kingmen tentaram imitar, gravando em um estúdio de sua cidade, Portland. A qualidade de som era precária, com míseros três canais de som. Reza a lenda que o problema não era o estúdio, que não era dos piores, mas o produtor da banda, que resolveu dar um “quê” de ambiente ao vivo para a música.

Se essa era a idéia mesmo ou não, ninguém garante. Mas deu certo. Como não conseguiram executar a música do mesmo jeito que os Wailers ou Berry, os Kingsmen tocaram com uma pequena mudança no riff. Apesar da indigência técnica da gravação e da banda, essa se tornou a versão clássica “Louie Louie”, o suposto marco zero do garage rock.

A despreocupação da gravação dos Kingsmen é tamanha que na segunda parte da música o vocalista Jack Ely parece esquecer a letra, pára no início no verso e em seguida o retoma como se nada tivesse acontecido. Há quem diga que a banda só seguiu tocando porque nenhum dos músicos conseguia ouvir o som do microfone de Ely durante a gravação.

Seja como for, o hit despojado – e o único ainda lembrado – dos Kingsmen entrou para a lista de covers de dez entre dez bandas de rock que não sabiam ou não estavam interessadas em tocar bem. E justamente devido à forma relaxada como foi gravado.

Mas a história da música prosseguiria. Embora não muito popular no Brasil até hoje, ela foi regravada por centenas de bandas mundo afora, mas sempre com base na versão dos garotos de Portland. Desentendimentos entre eles porém logo dividiram a banda. Diz-se que Ely saiu prematuramente por não levar muita fé na carreira de roqueiro. Quando a música estourou e ele tentou voltar, não foi aceito.

O baterista Lynn Easton registrou para si os direitos sobre o nome da banda e anunciou que seria seu líder e vocalista. Mas dali em diante, sempre que podia, “cantava” com playback. E Jack Ely não deixou por menos. Desprezado pelos antigos colegas, formou outra banda com o mesmo nome e saiu em turnê.

Mas nem com duas formações na estrada os Kingsmen conseguiram emplacar outro hit à altura de “Louie Louie”. No fim dos anos sessenta, nenhuma delas estava ainda ativa. Quanto ao esquecido Richard Berry, ele riu por último antes de morrer em 1997. No final dos anos 80, recuperou os direitos autorais sobre a música. E até ele fez uma regravação de “Louie Louie” para uma coletânea de sua gravadora.

Difíceis de encontrar em disco, as primeiras versões de “Louie Louie” estão à disposição de qualquer um na internet, incluindo a de Richard Berry e a dos Wailers. Aliás, encontram-se até versões antigas de “El Loco Cha Cha” em ritmo cubano, que em nada lembram “Louie Louie” por não terem o riff introduzido por Touzet.

No Youtube, há dezenas de versões, incluindo uma dos Stooges com letra considerada pornográfica. A mais bizarra que encontrei porém foi uma que mostra um Jack Ely já sexagenário cantando “Louie Louie” a capella para... um cavalo! Um triste flagrante de senilidade? Não, ele estava apenas se divertindo sem dar a mínima para o que iriam falar. Uma atitude bem rock n’ roll, não?

domingo, 29 de junho de 2008

Por que a atual inflação pode ser didática para o país

Por Angelo de Assis

O Brasil atualmente cresce cerca de 5% ao ano. Isso é bom, mas o limite de crescimento econômico do país parace ter sido atingido. Tanto que a inflação está aí de volta para não deixar dúvidas. Não cresceremos 10% ao ano como a China. Não pelo menos seguindo o atual modelo econômico.

Mas e por que a inflação está dando as caras? Simples. O crescimento econômico melhorou a renda das pessoas, especialmente as mais pobres. Como entre elas há uma grande demanda reprimida por consumo, elas foram às compras. Mas aí a indústria passou a não mais dar conta de atender tal demanda. Quando começam a faltar produtos, leva quem paga mais. Ou seja, há aumento de preços, inflação.

E qual a solução? Não é difícil identificá-la, mas não é fácil implementá-la.O país precisa ser mais produtivo, as indústrias precisam de mais agilidade para produzir mais e atender a demanda. Mas para isso seriam necessárias algumas mudanças estruturais que o país nunca esteve disposto a encarar de fato.

A legislação trabalhista continua obsoleta, ainda remonta à década de 50. Sob o pretexto de proteger o trabalhador da ganância dos patrões, no ambiente atual ela causa males à força de trabalho. Tornou-se um incentivo à não contratação formal, uma vez que gera uma burocracia cara para quem contrata e dificulta a demissão quando ela é necessária. Assim, muitos trabalhadores vêem-se condenados a atuar sempre no setor informal, sem qualquer dos direitos que a legislação deveria garantir.

Além disso, no ambiente atual de competição em nível global, tanto as exigências da legislação trabalhista quanto a burocracia estatal dificultam primeiro a criação de empresas e depois o seu crescimento. Elas não permitem às empresas a dinâmica que elas deveriam ter para se adaptar às circunstâncias da economia: surgir ou expandir-se quando há demanda e serem desfeitas ou demitir quando há contração.

Apesar da adoção de políticas econômica e cambial mais liberais pelo governo Lula, a burocracia para criar ou extingüir empresas ainda é grande e mexer na legislação trabalhista é tabu. O resultado é que a economia cresceu, mas esse crescimento rapidamente chegou a seu limite. Daqui para frente, crescer mais significa mais inflação. E o pior é que não há solução de curto prazo. Mesmo que o país fizesse as reformas de imediato, os resultados só começariam a aparecer no médio prazo.

Mas pelo menos a inflação atual pode ter efeito didático ao mostrar na prática que mudanças são necessárias. O país tem duas opções. A primeira é continuar crescendo, mas com inflação. A segunda é fazer reformas difíceis mas nas necessárias: mudar as leis do trabalho, diminuir os gastos e a burocracia estatais, ivestir mais educação entre outras.

A opção correta parece óbvia, mas o Brasil tem longa tradição de não resolver, mas sim de conviver e arrastar-se com seus principais problemas.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

I've just begun

Este é mais um teste para ver se consigo manter um blog regularmente atualizado do que um blog oficial propriamente dito.

Tratará de coisas que gosto e das quais me sinto minimamente à vontade para falar: jornalismo, fotografia, música e... economia (the dark side).

I've just begun. new material soon.



Um fim de tarde em Bauru-SP